8/03/09 - 05:16

Fico imaginando, tenho sempre azar na vida, não sei porquê. De alguma forma algo dá errado sem que eu peça para que dê certo, como se fosse grátis. Com certeza eu preferiria receber outras coisas grátis. Fico imaginando se um dia eu vá ter um filho. Não quero ter um filho, mas vou acabar tendo, porque recebo tantas coisas desagradáveis grátis que vou acabar ganhando um filho como bônus por um relacionamento, o qual provavelmente não vá longe.

Meu filho seria a maior decepção da minha vida. Seria como se ele estivesse me castigando por ter o colocado no mundo. Ei, seu merda, vou fazer você sofrer. Eu nunca faria ele sofrer, meu filho nunca sofreria, meu filho não teria um coração. Ele seria totalmente passível, tranquilo e “gente fina”, “parceria”.

Desde pequeno ele seria apaixonado por futebol, pediria para ir em todos os jogos do time dele, faria eu comprar bandeiras, camisetas e tudo o mais. Seu quarto não teria um poster do Led Zeppelin ou do Black Sabbath, teria um poster do Grêmio ou do Inter. Sua devoção pelo futebol eventualmente acabaria quando ele chegasse ao Ensino Médio. Então ele seria revelado um tremendo gênio da matemática, odiando literatura dizendo que o pai gosta de ler livros chatos de velhos bêbados e burros.

Ele passaria de ano, não ligaria para mulheres, acabaria maquinando uma entrada no colégio militar, e se formaria no Ensino Médio. Até lá me faria sair de casa cedo da manhã em um feriado uma vez por ano para vê-lo desfilar sob um sol escaldante. Até lá provavelmente estarei solteiro, a mãe do menino iria se viciar em crack ou alguma coisa assim, e em algum momento eu atingiria um estado de espírito maior para ficar com a tutela da criança. Eu só veria a mãe nas ocasiões especiais: formaturas e desfiles. Sempre com algum cara novo. Ora traficante, ora usuário.

Eu acabaria encontrando diversas mulheres, vivendo um pouco com cada uma, porque o desespero da solidão excessiva vai fazer com que eu me agarre à primeira coisa que eu veja, é assim com todos os seres humanos. A criança iria adorar seus padrastos, mas odiaria suas madrastas, faria o inferno, de modo que elas me largasse uma por uma, dizendo que eu não sabia ser um pai. Ganhava um título de mau pai como bônus por um pé na bunda. Essas coisas grátis que eu ganho...

Meu filho passaria na faculdade federal, em alguma engenharia ou matemática, dizendo que coisas como letras e jornalismo só servem para fracassados mortos de fome. Já na faculdade ele montaria um sindicato, clamando por melhores direitos para os estudantes. Será o aluno exemplo, passará com a nota máxima em tudo. Todos os professores me dirão que ele é o orgulho da família – que por sinal não existirá – e que eu tinha um ouro morando comigo na minha casa.

Por essa idade a parede entre nós dois estará totalmente completa, ele verá o pai como um cara perdido, melancólico (ele odiará melancolia) e vagabundo, por ser escritor e músico. Como ele vai ser um homem MUITO comum e ordinário, conheceria a mulher da vida dele na casa dos 20. A sua mulher também seria MUITO comum e ordinária, sem graça alguma, porém totalmente fiel e com um sorriso branco e largo.

Meu filho seria um engenheiro de sucesso, conhecido em vários lugares. Ele se mudaria para o outro lado da cidade, talvez para outra cidade ou ainda para outro estado. Deixaria o pai em casa para nunca mais falar com ele. Consideraria sua sogra a sua verdadeira mãe, e isso me daria mais asco do que nada, nunca me perguntaria da sua mãe antes de se mudar.

Será um cara feliz, bem remunerado, com pouco para reclamar depois que visse o dinheiro entrando na sua conta, fiel, leal, cheio de filhas e filhos que escovam os dentes todas as noites no mesmo horário, que taparia suas crianças, daria-lhes um beijo na testa e então apagaria o abajour.

Tenho um bom motivo para virar pansexual ou fazer vasectomia.

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