30/04/09 - 23:56

A menina do pomar de abelhas

Embriagada. Embriagada de cerveja loira como os cabelos, que outrora iam até os ombros. Riu-se nos pensamentos confusos quando deu por conta de que já estavam pelo cotovelo. Era noite. Sentou-se no pomar, observando as estrelas que dançavam num céu escuro, desenhando qualquer coisa que ela não conseguia assimilar. Ao topo do pomar ficava uma colmeia. Olhou pela primeira vez para a colmeia que nunca havia reparado em quase duas décadas de vida. Sempre esteve ali, e provavelmente estará por mais duas quase-décadas. Sentiu que invadia o espaço das abelhas. Ficou com medo de ser picada, mas não conseguia levantar, estava embriagada, com cerveja loira como seus cabelos e um coquetel azul como os olhos.

De repente pôs-se a pensar. Estava tudo tão claro, conseguia assimilar tudo, e tudo era genial e brilhante. Era tudo um segredo revelado. Lembrou-se do passado, de tudo aquilo que fazia ou que deixara de fazer. De uma forma era engraçado, divertido, mas de outra, tão triste. Sempre foi tão triste reviver aquilo que não pode se viver de novo, era como estufar os pulmões com um ar diferente, que maltratava o interior. Não era mais divertido, era simplesmente triste, mas de uma tristeza gostosa. Escorreu pela face uma lágrima embriagada, tão embriagada quanto ela. Tudo aquilo que jamais seria visto, e tudo aquilo que jamais seria vivido... novamente.

Então era tudo alegre, era tudo bom e as estrelas desenhavam caras sorridentes na escuridão do céu. Olhou para os lados e riu, ainda com a face molhada. O inventário de quase duas décadas de vida: embriaguez, lembranças e uma risada. Era gostoso. Pessoas gastaram duas décadas estudando para morrer, ela, embriagada, ria e chorava ao mesmo tempo. Tentou levantar-se, enquanto ria, mas não conseguia, o chão parecia mover-se de propósito, gritando “fique aqui”. Ela ainda invadia o espaço das abelhas. Pobres abelhas. Ela era uma grande filha da puta, certamente ficaria puta se alguém viesse invadir o seu lugar. Era tão cômico e bêbado que ela só fez rir. Só podia rir, era o que tinha no seu inventário.

Então parou de rir, colocou a mão na barriga, sentiu uma brisa secando a face molhada e adormeceu. O mundo ainda girava, a ressaca viria, mas aquilo era tão sublime que adormeceu como se as abelhas não fossem se importar. Talvez elas não se importassem mesmo. Estava tudo bem, o vento ainda batia na sua face.

À Caroline

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